O Mapa das águas —— a arte chinesa

《水图》—— 中国艺术

O Mapa das águas —— a arte chinesa

Por
Calebe Guerra
em
16/10/2023

A forma é apenas um meio de expressar o espírito” é um dos elementos mais importantes da arte chinesa. Essencialmente, artistas chineses há mais de de dois mil anos perceberam a importância de capturar o espírito da natureza, em vez de simplesmente copiá-lo. 

Ao retratar um homem ou uma mulher, um pintor trazia à tela suas semelhanças, ao invés de uma tentativa de ser fiel à realidade. Ao pintar árvores ou flores, ele tentava capturar suas características chamadas de “implicações em movimento”. 

Era o movimento, a vida e a vitalidade que importavam. Para ser bem sucedido, o artista deveria compreender profundamente os movimentos do objeto que pintava e reproduzi-los, ao invés de copiar sua forma. 

Mapa das águas 水图, de Ma Yuan 马远 (Dinastia Song)

Em quadros antigos, os artistas buscavam uma semelhança diferenciada, mais especificamente, desejavam ir além da semelhança superficial e idêntica da forma, para criar uma imagem única que capturasse como o caráter, o estado de espírito e a emoção do artista influenciavam a maneira como o objeto era visto, em suas diferentes formas de movimento.

Pode-se pensar nisso como o modo como as imagens mudam dependendo da internalização, do caráter e das emoções de cada artista. 

A semelhança visual, então, não é importante, mas sim a prática de compreender verdadeiramente o espírito de cada objeto e como ele interage com as emoções de cada pintor. Jing Hao 荆浩, um paisagista chinês do século 10, explicou que só depois de pintar um pinheiro dez mil vezes foi que conseguiu capturar o seu espírito. 

Cada pintura tem um significado bastante pessoal para cada pintor individual, e é isso que a teoria da arte chinesa busca em sua essência, e não fidelidade à forma. 

Su Shi 苏轼 da Dinastia Song foi um pintor e poeta que acreditava que “a habilidade artística é o equivalente ao que temos de mais próximo da verdade”. E isso se dava porque “imagens naturais não têm um estado normal imutável e, portanto, as imperfeições e aspectos incertos servem como evidência de sua natureza diversificada”.

Ao comentar sobre uma pintura de um amigo, ele disse que quando seu amigo pintava bambus, “tudo o que ele vê são bambus”. Su shi acreditava que o artista podia compreender tão bem os movimentos e a vida de um bambu a ponto de ter suas próprias emoções refletidas em seus movimentos. E a medida que ele mesmo se integra aos bambus, suas pinturas ficavam infinitamente frescas, para sempre. 

Ao retratar a natureza, pintores buscavam se integrar com os objetos e alcançar uma espécie de harmonia com a natureza. 

Esse método enfatizava a importância de expressar a emoção do pintor ao capturar o espírito e movimento do objeto. 

Além de imagens, os pintores buscavam pintar emoções. 

Ma Yuan (1160 - 1225)

Expressando essa ideia, Ma Yuan 马远, artista consagrado da Dinastia Song, pintou uma seleção de quadros chamada Mapa das Águas 水图, onde buscou eternizar em seus quadros as emoções estava tendo no momento da pintura a partir dos diferentes movimentos das águas. 

Em Mapa das Águas, Ma Yuan buscou expressar-se a partir do espírito da água. O que vemos são emoções como ira, tranquilidade, paz, etc. 

Os movimentos da água são criados a partir de diferentes traços e estilos que dão ao projeto sua característica única, servindo como uma extensão das emoções de Ma Yuan. 

A forma é apenas um meio de expressar o espírito” era um método, e esse método enfatizava a importância de exibir a emoção do pintor ao capturar o espírito da natureza. 

Essa ideia de ir além das imagens permitia aos pintores expressar suas emoções internas, pensamentos espirituais e mostrar um “eu” único, uma emoção única em cada obra.